Administração Pública (AP), transparência, dados abertos e ética foram os eixos dominantes da sessão dedicada ao tema Os Arquivos e a Qualidade da Democracia, que ocorreu no passado dia 17, no âmbito do Fórum O Lugar da Cultura – Modelos e Desafios, de iniciativa governamental.
Esta sessão sectorial, organizada pela Direcção Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB), contou com a presença de arquivistas, responsáveis da tutela, dirigentes da AP, investigadores e representantes das associações profissionais. Com algumas comunicações a demorarem mais do que o previsto, o debate e a discussão de propostas não aconteceu.
O Notícia BAD esteve no Centro Cultural de Belém e dá-lhe conta dos projectos apresentados, tendo todos eles em comum o enfoque no tratamento de dados e na gestão da informação da Administração.
Teoria e prática nos arquivos da Administração
Jaime Quesado, presidente da Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública (ESPAP), referiu o projecto no âmbito da organização e funcionamento da AP ao nível das TIC, dos Recursos Humanos, das Finanças e das Compras Públicas. Neste projecto, a Gestão Documental assume-se como uma área transversal de grande relevo, estando a ser preparada uma arquitectura de referência – a Agenda da Gestão Documental para a AP, em articulação com a Agência para a Modernização Administrativa (AMA) e a DGLAB. Trata-se de um plano estratégico que se integra nos objectivos da ESPAP e posiciona-se acima da legislatura política. Assim, até 2017 pretende-se promover os Serviços Partilhados de Gestão Documental numa lógica de rede, envolvendo os Serviços da AP e recorrendo a instrumentos de interoperabilidade como é o caso da Macroestrutura Funcional (MEF).
Pelo Tribunal de Contas (TC), Márcia Vala e Cristina Cardoso apresentaram uma comunicação centrada nas evidências dos documentos de arquivo como instrumentos de trabalho daquele Tribunal. Ao longo da sua história, o TC assumiu-se como um órgão de controlo das contas públicas recorrendo, para o efeito, aos documentos de arquivo, atendendo tanto aos seus aspectos formais como de conteúdo. Na sua evolução orgânica o TC, segundo as oradoras, afirmou-se como um sistema de responsabilidade financeira transparente e eficaz onde a produção de prova documental assume particular relevo na imputação dessa responsabilidade. Por este motivo a preservação do arquivo do TC foi integrada no Plano de Prevenção de Riscos. Actualmente a transparência assume-se como uma regra com consequências ao nível do acesso à documentação, sendo a publicitação das decisões disso um exemplo.
Gabriel David, da Universidade do Porto, destacou a importância dos dados, colocando-os no cento do conhecimento científico e assumindo-os como o “novo petróleo”, na esteira de Neelie Kroes (“Data is the new oil”, EU Digital Agenda). Referiu a necessidade de ter repositórios inteligíveis para terceiros, o que só se consegue através da associação de metadados pertinentes. Lançou desafios: Como armazenar e gerir os dados registados em contínuo por sensores de sistemas de monitorização, seja por impositivos legais, por interesse científico ou para tomada de decisão? Neste sentido, referiu a importância de estruturar os repositórios de dados já que dessa arquitectura resulta a credibilidade dos dados e a sua compreensão. Alertou para o facto de os sistemas digitais aumentarem a eficácia, mas também a complexidade das regras: não se pode olhar para a informação apenas quando o documento vai para o arquivo e é fundamental a existência de planos de preservação digital.
Centrando as suas preocupações acerca da participação dos cidadãos no escrutínio das administrações abertas, José Carlos Nascimento, da Universidade do Minho, colocou a tónica na necessidade de haver Sistemas de Informação tendencialmente centrados não na organização mas sim no cidadão, numa lógica integrada de criação de valor e de melhoria contínua. A confidencialidade, a integridade (ou a qualidade dos dados) e a disponibilidade são factores de qualidade e segurança no caso do Sistema de Informação da Saúde. Pretende-se garantir o acesso à informação pertinente em cada momento.
A terminar a sessão, Alexandra Lourenço, na qualidade de presidente da Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas (BAD), chamou a atenção para a questão da ética no exercício das actividades do profissional da informação. A ética profissional é o garante da salvaguarda da isenção e transparência na gestão da informação e vector fundamental no funcionamento da Administração. Alexandra Lourenço salientou o Código de Ética português que, em 1999, foi desenvolvido por três associações de profissionais: a Associação Portuguesa de Documentação e Informação na Saúde (APDIS), a Associação Portuguesa para o Desenvolvimento de Informação Científica e Técnica (INCITE) e a BAD. A presidente da BAD chamou a atenção para o facto desse código estar alinhado com as preocupações comuns a nível europeu e internacional. E, enfatizou, sem ética não pode existir “uma participação responsável e respeitadora dos direitos dos cidadãos”.
Helena Neves