Branquinho da Fonseca

No ano em que se assinala o 50.º aniversário da morte de António José Branquinho da Fonseca (1905-1974), a BAD, a Fundação Calouste Gulbenkian e a Câmara Municipal de Cascais evocaram, a 21 de novembro de 2024, o Homem e a Obra num Encontro em que se destacou o seu papel preponderante na criação da primeira Biblioteca Itinerante do país, em 1953, enquanto Conservador do Museu-Biblioteca Conde de Castro Guimarães, em Cascais e, a partir de 1958, como organizador e primeiro Diretor do Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação Calouste Gulbenkian.

António José Branquinho da Fonseca, filho do escritor Tomás da Fonseca e de Clotilde Madeira Branquinho da Fonseca, nasce a 4 de maio de 1905, em Mortágua (natural de Laceiras, freguesia de Pala, concelho de Mortágua e distrito de Viseu) e falece, em Cascais, a 7 de maio de 1974. 

Licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, Branquinho da Fonseca teve trinta anos de atividade literária, publicando em 1926, o primeiro livro de Poemas e o último em 1956 – um volume de narrativas Bandeira Preta, destacando-se, sobretudo, nos domínios do conto e da novela. Figura cimeira do segundo modernismo português (participa em 1925 na fundação da revista literária Tríptico; em 1927 dirige com José Régio e João Gaspar Simões a revista Presença e em 1930 funda com Miguel Torga, a revista Sinal) viria a ser nomeado Conservador do Registo Civil de Marvão, em 1935 e no ano seguinte, para o mesmo cargo na Nazaré. 

Nos anos 40 do século XX, reside em Cascais e concorre ao lugar de Conservador do Museu-Biblioteca Condes de Castro Guimarães, cargo que ocupa desde 1943. É como Conservador que coloca em prática a primeira experiência realizada em Portugal no domínio das Bibliotecas Itinerantes, “adaptando e apetrechando uma carrinha do referido Museu, a qual por alguns anos proporcionará, através do regime do empréstimo domiciliário, a fruição do livro a grande parte da população do concelho de Cascais” (Boletim Cultural, 1984, p. 7). 

Parafraseando Maria Mota Almeida no Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa

“o pioneirismo deste apaixonado pela causa pública revela-se pois no olhar sempre mais longe, materializado na renovação e atualização bibliográfica, elaborada com base, não na ótica do responsável pela biblioteca, mas na perspetiva do leitor, pois os livros não são para quem a dirige, são para quem lá vai. Logo no início do cargo, adquire 450 obras para ir ao encontro dos potenciais beneficiários. Além disso: (…) 24 horas depois de um leitor requisitar uma obra que não existe na biblioteca, a direção manda-a adquirir e entrega-a ao interessado” (2022, p. 119). 

A 26 de julho de 1953, esta biblioteca já circulava aos domingos pelas povoações mais longínquas do concelho de Cascais. O seu pioneirismo na área da literacia da leitura pública e na criação da Biblioteca Itinerante destinada a servir as localidades mais distantes deste concelho, leva a que fosse convidado em 1958, pela Fundação Calouste Gulbenkian, para organizar e dirigir o Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas, tendo sido o seu primeiro Diretor até 1974, ano da sua morte. 

Como refere o escritor e poeta David Mourão-Ferreira (1927-1996), no Boletim Cultural da Fundação Calouste Gulbenkian – Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas: 

“convidado pelo Doutor José de Azeredo Perdigão a organizar e dirigir, na Fundação Calouste Gulbenkian, o Serviço de Bibliotecas Itinerantes, Branquinho da Fonseca tem então ensejo de realizar, à escala nacional o que em Cascais tão-só pudera deixar esboçado; e, em 1958, surgem nas estradas portuguesas as primeiras unidades móveis de tal serviço, o qual nos anos subsequentes conhecerá – em orgânica articulação, a partir de 1960, com a instalação das primeiras Bibliotecas Fixas – uma extensão e um desenvolvimento sem precedentes no domínio da leitura pública em Portugal” (1984, p. 8).

Para o papel no domínio das Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação Calouste Gulbenkian, Branquinho da Fonseca teve o apoio do Presidente do Conselho de Administração da Fundação, do Administrador responsável por esse pelouro, Professor Doutor A. de Ferrer Correia, coadjuvado, entre outros, pelos escritores Domingos Monteiro, António Quadros, Orlando Vitorino, Nuno Sampaio e Miranda Mendes, bem como, dos funcionários que teve o cuidado de formar para a execução de diversas tarefas nas áreas da biblioteconomia, administrativa ou cultural. 

Em suma, Branquinho da Fonseca teve um papel preponderante na difusão do livro, no estímulo da leitura, na descentralização e acesso ao conhecimento, na única rede de leitura pública em Portugal em que se pratica, de um modo gratuito, o regime do livre acesso de um empréstimo domiciliário. Para além do trabalho realizado na organização da biblioteca do Museu Conde de Castro Guimarães, implementa uma Biblioteca Itinerante destinada a servir as localidades mais longínquas de Cascais, projeto pioneiro que, a partir de 1958, a Fundação Calouste Gulbenkian aproveita e Branquinho da Fonseca dirige e expande a nível nacional, como organizador e primeiro Diretor do Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação. De 1958 e até 2002, as Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian levam o livro e a leitura a todo o território nacional.Foi, aliás, através da itinerância das carrinhas da marca Citroën – Biblioteca Itinerante que muitos leitores do Portugal interior usufruíram do empréstimo domiciliário, da leitura de livros, acedendo à cultura e ao conhecimento. 

O carro-biblioteca de Branquinho da Fonseca – a Biblioteca Itinerante da Câmara Municipal de Cascais – circulou quase sem interrupções até ao final do século XX, altura em que cessou a atividade. Ainda hoje e, partindo da sua inspiração, Cascais tem ao serviço uma Biblioteca Móvel: a BIC (Biblioteca Móvel de Cascais), que percorre as escolas e alguns parques. O funcionamento deste circuito acompanha o calendário escolar com o objetivo de promover o acesso ao livro e o gosto pela leitura.

Branquinho da Fonseca também fez chegar o seu projeto ao concelho de Mortágua, de onde é natural, através da criação da Biblioteca Itinerante de Mortágua, atual Biblioteca Municipal Branquinho da Fonseca e da criação Biblioteca Fixa nº 15, que funcionou até 2002.

Recordamos o seu poema “Biblioteca” no 50.º aniversário da sua morte:

BIBLIOTECA 

É sempre tarde ou ainda cedo, 
pois o momento é sempre morto… 
E a minha força não tem medo, 
mas adormeço e não me importo… 
O templo existe mais vazio, 
cheio de sombra e colunatas… 
Olhei-o, entrei…gelei de frio… 
passei… fugi… só li as datas… 
Inoportuno e casual, 
Este romance começou 
logo no fim, logo no meio… 
E achando-o mau e sempre igual, 
vai-me vivendo como sou, 
e eu, folha a folha, só o leio… (Fonseca, 2010, p. 147) 

Referências bibliográficas
Almeida, M.M. (2022). “António José Branquinho da Fonseca” in Ferreira, E., Monteiro, J. DO., Silva, R. H. D., & Pereira, E. Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa: (edição revista e ampliada). IHA/NOVA FCSH, pp. 118-120. https://doi.org/10.34619/oelt-t7xq 
Boletim Cultural (1984). Fundação Calouste Gulbenkian. Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas. VI Série, N.º 1, janeiro. 
Fonseca, B. (2010). Obras completas, vol. I., Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

Ana Margarida da Costa
Bibliotecária

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