O clube de leitura Manuel Teixeira Gomes foi criado em 2002, tendo obtido um subsídio para apoio ao seu desenvolvimento do Serviço de Bolsas da Fundação Calouste Gulbenkian. Começou por funcionar com 2 grupos de 20 membros com idades entre os 18 e os 78.
Todos os livros, e já contamos com mais de 100, são uma descoberta para cada um, por eles se elevam vozes de lealdade com certos escritores, se destronam personagens e se evocam outros textos, outras histórias.
Tomados pelo quente do chá, cada membro desabafa o que lhe ficou no silêncio da sua leitura. Mais do que partilhar ideias ou experiências, os nossos membros desejam dar (sem receber em troca por vezes) o que lhes tocou em cada página, em cada frase, partilham lamentos, gargalhadas, ironias, expressões como “chorei tanto”, “quero ler mais deste autor”, “não gostei nada”, “pus de lado”.
Atualmente, em cada sessão, estão presentes, em média, 15 membros e os livros, que inicialmente eram adquiridos pela Câmara Municipal de Portimão ou emprestados por outros clubes de leitura do Algarve, são, agora, selecionados a partir de uma lista de oportunidades dos livreiros locais e cada membro compra o seu.
O objetivo inicial mantém-se: continuamos a ler o mesmo livro ao mesmo tempo e, num dia e hora combinados, juntamo-nos para comentar as páginas lidas. E tal como no início deste projeto também continuamos em todas as sessões a sair do livro para explorar as experiências pessoais de cada um.
Com Clarice Lispector conhecemos o quotidiano das famílias e falámos do nosso, com “A bela adormecida vai à escola” destronámos um rei para acordar as princesas da nossa História. Teixeira Gomes permitiu falar, e muito, das gentes singulares e dos costumes do Algarve e Possidónio Cachapa foi tão emotivo que vamos reler. O poeta que se casou ficou esquecido por alguns, ou nem foi lido por outros, os novos, pelo que Skármeta será a nossa próxima leitura, porque ao longo dos anos, uns deixaram de aparecer e outros passaram a membros honorários, mas todos os anos, o Clube de Leitura recebe membros novos, entram nas sessões de mente aberta para partilharem as suas experiências à espera de ouvirem diferentes imagens e interpretações das mesmas passagens lidas. Vêm do Canadá, de Lagos, de Ferragudo, de Lisboa ou Portalegre, são estrangeiros em casa própria, trazem novidades de lá e para lá levam as nossas leituras.
Muitos escritores também partilharam connosco o que sentiram quando escreveram aquelas histórias. Pepetela, Mário de Carvalho, Maria do Vale Cartaxo, Mia Couto, José Saramago, Gonçalo M. Tavares, António Manuel Venda, Hernán Neira, Joaquim Mestre, José Luí Peixoto, Luandino Vieira, Pedro Sena-Lino, António Lobo Antunes.
Partilhámos experiências e trocámos sugestões com clubes de leitura da vizinha Andaluzia. Fomos ao teatro, ao cinema, ouvimos música, jantámos e bebemos chocolate quente, sempre com o livro na mão e as histórias no pensamento. Trocámos ideias, muitas ideias, sobre o que são clubes de leitura, como funcionam e como se mantêm ativos quando organizámos o I Encontro de Clubes de Leitura do Algarve, evento que contou com a participação de 250 membros de clubes de leitura. Visitámos igrejas, museus e conhecemos outras bibliotecas.
Lemos portugueses, clássicos, atuais e estrangeiros. Lemos italianos, húngaros, americanos e iranianos. “Budapeste” veio com Chico Buarque de Holanda. Passámos também com “Marlboro Sarajevo” pela antiga Jugoslávia e olhámos para a cultura russa com “Sónetchka” e de Ivan Bunin com “O amor de Mítia” ou um “Convite para uma decapitação” de Nabokov.
Atualmente, temos gregos e marroquinos na prateleira à espera das nossas mãos.
Muitas leituras ainda deram lugar a cursos de escrita criativa, workshops de riso e palavras, palestras sobre literatura comparada com Paula Mendes Coelho onde o padre é analisado nas telas de Paula Rego, ouvimos ainda contos para adultos, navegámos na internet e criámos perfis de facebook. Tivemos sessões de poesia erótica, odes quase à desgarrada e muitas conversas. Comemorámos os dias de Reis com bolos e Vinho do Porto, provámos receitas indianas e iranianas, comemos castanhas assadas e bebemos ginjinha e ainda de mãos carinhosas pelámos sardinhas em Agosto. Encontrámo-nos com mulheres, no âmbito do dia internacional das mulheres, fizemos exposições de livros, objetos e lugares de leituras.
Lemos poesia, teatro, policiais, contos infantis, biografias, crónicas e notícias. Fomos também nós notícia em jornais locais.
Hoje, mais do que nunca, 10 anos passados, vale a coragem de recordar estas leituras, estas pessoas, que leem, que sentem o que leem e fazem da leitura e dos livros a sua casa e na biblioteca pública o demonstram. Em tempo de crise e contenção vale a coragem da partilha, da compra individual, do ler sozinho e acompanhado, do estar presente. Vale a coragem de afirmar que não se leu, que se vai ler, que logo se vê.
Hoje, 10 anos depois da primeira leitura, o Clube de Leitura da Biblioteca Municipal de Portimão continua a ler.
Clube de Leitura da Biblioteca Municipal de Portimão
Contribuição da delegação sul da BAD