Na sequência dos que já divulguei aqui no «Notícia BAD», vou hoje terminar os breves apontamentos sobre um percurso pessoal que afinal muito se entrelaça na existência da nossa associação profissional.
4
Não pertencendo eu ao grupo dos designados “born digital”, as realidades de que falo forçosamente incidem sobretudo na idade do analógico, e nunca aliás pretendi ocultar as dificuldades que senti em utilizar com a desejável competência as hoje incontornáveis TIC, obviamente desconhecidas desse grande bibliotecário que já citei no ponto anterior, Raúl Proença, patrono do Prémio que a BAD instituiu em 1998.
No entanto, parece-me justo dar-vos nota de que desde muito cedo foi tentado, contornando a carência de formadores e os nossos tão deficientes recursos, introduzir crescentemente os novos media e o digital na formação a disponibilizar.
A outro nível, mas perseguindo o mesmo objectivo, devo recordar que, para complementar o espaço que amavelmente nos fora cedido pelo então diretor da BN ainda antes da institucionalização da BAD, quando aí assumi a presidência adquiriu-se em 1983 a atual sede, sobretudo para permitir aumentar os cursos já existentes. Foram tempos difíceis, batalhando sempre em várias frentes e com raros apoios ocasionais, mas nunca perdendo de vista que se tornava indispensável mostrar trabalho e sobretudo uma elevada consciência profissional se pretendíamos que nos fosse finalmente feita justiça em termos de reconhecimento social e também a nível salarial, sendo certo que tudo isso tinha tardado muitas décadas…
E até mesmo entre nós, e no interior da comissão organizadora inicial da Associação, de que fiz parte, detetámos no princípio algumas dúvidas sobre se seríamos capazes de manter uma exigente estrutura associativa: daí alguma resistência em passar os “Cadernos” para a posse da BAD – cedidos só em 1983 pelo heróico grupo dos seus fundadores de Coimbra – revista de que me tornei a nova diretora, apenas por ser a presidente.
Mas a preocupação com a vertente editorial passou a estar desde logo também bastante visível no funcionamento pelo menos interno da BAD, apesar de reconhecidamente não ser algo fácil de manter com a qualidade e regularidade indispensáveis, tendo embora uma natural e estreita relação com os programas formativos. Sobretudo os seus últimos responsáveis, dados os seus conhecimentos e experiência anteriores, desenvolveram um notável trabalho nessa área.
Mas a verdade é que todos também reconhecem os recentes grandes progressos, aos vários níveis, no fundamental e exigente domínio da comunicação, em especial entre associados, mas igualmente com o exterior.
Em paralelo e num passado já distante, o enorme esforço com que a BAD se bateu infatigavelmente para conseguir primeiro a nossa equiparação a técnico superior e mais tarde finalmente o estabelecimento das carreiras profissionais não podem deixar de merecer uma justa referência e devo antes de mais lembrar a grande ajuda que pessoalmente tive da nossa associada e conhecida arquivista Madalena Arruda Garcia. Fizemos ambas inúmeras reuniões na DG da Função Pública, sem desistirmos nunca de demonstrar e justificar as razões que bem sabíamos há muito nos assistirem…
A publicação do Decreto-Lei nº 280/79, de 10 de Agosto, mesmo com deficiências, veio assim coroar os nossos denodados esforços, mas a mim ainda valeu a posteriori o pedido de um alto responsável do então Ministério do Ensino Superior e das Belas Artes para que, face à experiência que adquirira, eu elaborasse a proposta para a necessária aplicação da nova legislação a todos os bibliotecários e arquivistas, enquanto funcionários dos muitos e variados organismos pelo mesmo tutelado! Mais uma batalha a que me senti obrigada mas que, sem falsa modéstia, consegui vencer. Não obstante a proposta que apresentei para esse efeito de imediato ter sido contrariada no início, acabei por poder utilizar inteiramente as possibilidades que tínhamos conseguido introduzir para que às colegas, por exemplo da Torre do Tombo, que esperavam há dezenas de anos a sua mais do que justa promoção, fosse possível “saltar” um degrau e poder assim reformar-se com um pouco mais de conforto…
Deve reconhecer-se, porém, que bastante mais tarde, já em 1987, no Programa das Bibliotecas Municipais – durante muitos anos sob a minha responsabilidade técnica – foi possível melhorar bastante a situação dos recursos humanos de que elas foram dotadas: na maior parte das autarquias que o integravam, e só para dar disso um exemplo, foi mesmo expressamente criado para as dirigir o lugar de chefe de divisão.
A Associação sempre pugnou por obter uma justa satisfação profissional e, sobretudo através da intervenção dos seus formadores, procurou que as bibliotecas públicas fossem orientadas e reconhecidas como equipamentos de proximidade e as pessoas a sua verdadeira razão de ser, apostando no desenvolvimento integral enquanto cidadãos, mesmo sem esquecer a importância das coleções e das novas tecnologias.
5
Outro tipo de preocupação deve ser igualmente assinalado à BAD. Porque sentíamos penosamente o isolamento a que as condições políticas tinham longamente condenado o país – lembramos que Portugal tinha sido excluído pela própria UNESCO, mas foi a seu convite que a BAD se fez representar logo em 1974 pelo colega Jorge Peixoto na importante Conferência Intergovernamental em Paris – considerávamos essenciais as relações com os nossos congéneres de outras latitudes.
Aproveitando da melhor maneira todas as várias oportunidades de apoios externos e alguns internos, foram organizadas múltiplas visitas de estudo a instituições de além fronteiras, o que muito agradava aos colegas, pelo grande partido que daí tiravam, abertura de novos horizontes e óbvios ensinamentos profissionais que a todos eram assim proporcionados. Por isso se efetuaram muitas deslocações de distintos grupos organizados a França, Espanha, Reino Unido, Escandinávia, organismos comunitários, etc. Tiveram bastante regularidade os Seminários Luso – Espanhóis e os que passaram a congregar delegados dos países nórdicos e do sul da Europa. A BAD organizou vários Encontros de Bibliotecários de Língua Portuguesa e os de Arquivistas Lusófonos. Desde a sua criação a Associação tinha-se filiado na IFLA, no ICA e na FID (depois extinta), como também esteve na génese da constituição da EBLIDA, que pretendia ser uma bem necessária voz ativa dos profissionais, então confrontados com os problemas do Telematics for Libraries Program.
A Rede Nacional de Bibliotecas Públicas – RNBP – no seu contexto específico, teve também pelo vasto relacionamento com países estrangeiros um papel decisivo na origem do NAPLE, afinal uma feliz consequência da Conferência Internacional “Bibliotecas Públicas: Inventando o Futuro”, no CCB, em Maio de 2000, única que fora integrada no programa oficial da Presidência Europeia de Portugal naquele ano. (Ver a este propósito um interessante texto então saído no “Público”, bem como o discurso de abertura do Presidente Jorge Sampaio).
Para terminar, quero valorizar aqui mais uma vez a importância decisiva das centenas de profissionais, entusiásticos e dedicados militantes, cujo excelente trabalho durante 30 anos me foi possível testemunhar e acompanhar. Fiz pois questão, como modesto agradecimento, de listar todos os nomes desses colegas que me foi possível juntar num despretensioso folheto, divulgado nas comemorações dos 30 anos da RNBP, realizadas em Lisboa no MUDE, precisamente na data em que fora assinado o Despacho de nomeação da então Presidente da BAD pela SEC, Teresa Patrício Gouveia – que teve também a presença de alguns Autarcas, como o vice-presidente da ANMP e da Vereadora da CML, Catarina Vaz Pinto. Tal comemoração teve depois nova edição no Porto, Biblioteca Municipal Almeida Garrett, dessa vez com a participação do Ministro da Cultura, Luís Castro Mendes e do presidente da CMP, Rui Moreira.