No final de 2020, o número de trabalhadores do sexo feminino era superior ao número de trabalhadores do sexo masculino na Administração Pública em Portugal, uma tendência da feminização que contraria o mercado de trabalho em geral. Do total de 718.947 trabalhadores, 440.151 (61%) são do sexo feminino e 278.796 (39%) são do sexo masculino. Os dados são do Boletim Estatístico do Emprego Público (BOEP) (Lisboa: DGAEP, jun. 2021), que, no âmbito da Administração Regional e Local, se refletem de modo distinto, sendo o número de trabalhadores de ambos os sexos sensivelmente idêntico: 81.399 homens e 81.366 mulheres, totalizando 162.765.
Quando considerados os números em termos de nível de escolaridade dos trabalhadores da Administração Pública, querendo destacar-se os trabalhadores na posse dos graus de licenciatura, mestrado e doutoramento, o número do sexo feminino face ao número do sexo masculino quase triplica no primeiro (81.899 vs 210.403), é aproximadamente o dobro no segundo (20.453 vs 37.582) e sensivelmente idêntico no terceiro (11.366 vs 10.948). No âmbito da Administração Regional e Local, a realidade é apenas distinta no âmbito dos trabalhadores na posse de licenciatura, com 16.841 do sexo masculino e 32.374 do sexo feminino, uma vez que também temos quase o dobro de trabalhadores do sexo feminino (3.237) face aos trabalhadores do sexo masculino (1.818) com o grau de mestrado. O número de doutorados de ambos os sexos é sensivelmente idêntico (149 homens vs 142 mulheres) (BOEP, jun. 2021).
Também o número de dirigentes superiores e intermédios da Administração Pública em Portugal é aproximado, sendo mais expressivo nos trabalhadores do sexo feminino, com o número de 7.330, face aos trabalhadores do sexo masculino, que somam 6.183, demonstrando uma aparente equidade no acesso aos cargos por ambos os sexos, se não repararmos que o número de mulheres na carreira de técnico superior mais do que duplica o número de homens. Se considerarmos os números de trabalhadores na carreira de técnico superior, os do sexo feminino duplicam os do sexo masculino (48.455 vs 23.006), e, incompreensivelmente em 2021, ainda não integram os Informáticos, que mantêm uma carreira específica. No âmbito mais restrito da Administração Regional e Local, os dirigentes intermédios e superiores do sexo masculino são sensivelmente idênticos aos do sexo feminino (2.132 vs 2.343), assim como quase duplica o número de mulheres face ao dos homens na carreira de técnico superior (18.184 vs 10.064), refletindo uma realidade idêntica à encontrada em termos gerais para toda a Administração Pública em Portugal (BOEP, jun. 2021).
Estes dados permitem contextualizar e melhor entender os resultados do estudo de Ana Lúcia Filipe acerca dos Os Gestores de Informação nos arquivos municipais de Portugal (Lisboa: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2021), tendo por base uma amostra, designadamente os 80 municípios na ‘região’ entre os rios Tejo e Mondego, incluindo a Região de Coimbra. Em consonância com os dados gerais relativos à Administração Pública, os profissionais da informação do sexo feminino, que exercem funções nos arquivos municipais (282), ultrapassam o dobro dos do sexo masculino (126), evidenciando-se a feminização da profissão. Em 40 arquivos, os profissionais da informação do sexo feminino assumem o ‘lugar’ de responsável, enquanto 27 do sexo masculino ocupam esse ‘cargo’, nem sempre acompanhando o acréscimo de responsabilidade um aumento remuneratório. Os outros 13 municípios não têm arquivo municipal ou não têm recursos humanos afetos ao mesmo, situação que efetivamente conduz ao mesmo resultado.
Carlos Guardado da Silva
Professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa